"Aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende"
Leonardo da Vinci

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Patrícia Acioli

A execução sumária da juíza Patrícia Acioli, ocorrida há uma semana, veio como um tiro, 21 para ser exato, ao Estado Democrático de Direito. Não, não foi a primeira queda. Foi o descortinamento do que, há muito, se sabe existir, mas que nos esforçamos para não ver : o poder paralelo do crime e a pungência desse quarto poder, que, ao arrepio das regras sociais vigentes criadas pelo Poder Legislativo, se substitui ao Poder Judiciário, julgando, condenando e executando o aplicador da lei, por descontentamento não com a prática do ilícito, mas com a sua punição.
Mais chocante ainda é ver que, no dia seguinte ao bárbaro crime, um deputado estadual, publica em seu twitter uma mensagem em que diz que a juíza executada teria, ao longo de sua carreira, conquistado muitos inimigos por sua postura pessoal, pois, segundo afirma, humilharia os réus durante os interrogatórios.
O comentário do deputado, considerado por muitos como uma tentativa de chamar atenção para si e manter-se em destaque, no melhor estilo « falem mal, mas falem de mim », foi, no mínimo inadequado.
Em seu perfil em sua página pessoal, o deputado se qualifica como alguém que não se curva diante da « ditadura do politicamente correto » e « mantém posições firmes em favor da redução da maioridade penal e da defesa da pena de morte na punição de crimes hediondos »; assim como se opõe ao « desarmamento do cidadão de bem » (trechos extraídos de seu portal na Internet).
Na minha curta experiência penal, atuei como estagiária da Defensoria Pública na Capital do Estado do Rio de Janeiro, não conheci a D. Magistrada, nunca tive acesso a autos de processo em que ela tenha atuado, e não conheço seu modo de agir em audiência. Seria leviano dizer se procede ou não a alegação de que ela empregaria tratamento humilhante ao dirigir-se aos réus.
Mas o que sei é que, caso efetivamente houvesse fundamento em tal alegação, isso constaria de autos dos processos (em sua grande maioria públicos) ou teriam sido objeto de reclamação (ou reclamações) à Corregedoria, o que ensejaria a instauração de procedimento administrativo contra a magistrada, o que, até o presente momento, não foi ventilado.
Parece-me mais razoável que tal afirmação não possua amparo fático. Mas, admitamos a hipótese de que a magistrada não fosse « simpática » em audiência, até porque, felizmente, « simpatia » não é critério para a aprovação em concurso público, o que mudaria ? Sentença condenatória dada « com simpatia » continua a ser sentença condenatória. Pior : a tal « simpatia » pode até ser confundida com escárnio.
O condenado (com ou sem « simpatia ») vai ressentir-se, pois, por mais que não seja « culpa » do juiz o fato de o condenado ter de cumprir pena, senão de si mesmo que se conduziu de forma contrária às leis, ele não entende que mereça ser punido. E a « personificação » de seu algoz é o juiz que assina a sentença condenatória. E é contra ele, contra o juiz, que tal criminoso direcionará sua raiva.
E assim, o crime mostra seu poder : julga, condena e executa uma pessoa que estava apenas cumprindo seu dever ao aplicar as leis e zelar pela manutenção da ordem social.
Uma juíza. Uma profissional do Direito. Uma mãe de família. Uma mulher. Um ser humano como eu e você, com sonhos, esperanças, frustrações, crenças, descrenças, lembranças e família. Um ser humano que teve sua existência abreviada de forma brutal. Uma mãe que foi roubada do convívio de seus filhos por uma rajada de tiros de armas de uso especial.
Com o brutal assassinato da Dra. Patrícia Acioli, enfraquece um pouco mais o Estado Democrático de Direito, esse mesmo Estado Democrático de Direito que assegura ao deputado o direito de manifestar livremente sua infeliz opinião, por mais absurda que ela possa ser.
Com o brutal assassinato de Patrícia Acioli, cresce a sensação de que precisamos, sim, de mais e mais cidadãos combativos, que façam os seus trabalhos com afinco e honestidade, na construção de uma sociedade em que a criminalidade não exerça tamanho poder.
Deixo meus sentimentos à família da vítima e tenho certeza de que não há em nenhum dicionário palavras suficientes para reconfortá-los nesse momento.

Em tempo, esclareço que deixo de citar o nome do deputado estadual, pois não quero contribuir com sua promoção pessoal (se esse foi o intuito de seu infeliz comentário). No entanto, deixo o link de seu portal na internet para que, caso queiram, acessem e formem livremente suas opiniões.

***

2 comentários:

Anônimo disse...

Juju minha linda!
Primeiramente, muitas saudades que sinto de vc, a Dra mais linda do mundo.
Sobre o caso da magistrada executada é de fato um grande absurdo mesmo mas vejo da seguinte forma:
Nossa democracia ainda se encontra em um estágio de amadurecimento e absurdos como esse, apesar de chocar e revoltar todos nós, é parte integrante de um fenômeno social que a cada dia, muito lentamente vai mudando. Se olharmos só para esse caso, é de fato revoltante mas...se olharmos do ponto de vista coletivo, acredito que ainda não atingimos a maturidade democrática necessária para que crimes como esses não aconteçam nunca mais. Estamos evoluindo sim. O reconhecimento de certos direitos sociais em nosso país é a prova disso mas tenho certeza que chegaremos lá.

BJSSS, para a Dra. irrefutavelmente mais linda do mundo.!!!

ALFEN

Ju Foch disse...

Alfen,
obrigada.
O que me chocou mais do que o crime bárbaro (que, infelizmente, encontramos em qualquer lugar do mundo), foi a "justificativa" do deputado, a forma de "banalizar" algo grave, "culpabilizar" a vítima e se utilizar desse crime para voltar para si as luzes do palanque político. Lamentável.
Bjs